Diante da configuração de pandemia do coronavírus, é ímpar a situação em que hoje se encontra o Poder Público perante o reconhecimento do estado de calamidade pelo Congresso Nacional. Diversas são as peculiaridades jurídicas que se formam no entorno dos contratos de direito privado, notadamente os contratos civis e os contratos consumeristas. Neste sentido, para que se faça uma boa gestão das condições atuais, alguns pontos devem orientar desde já a tomada de decisões por parte de empresas e particulares.

É preciso destacar que os limites para a adequação dos contratos ante a caracterização de pandemia ainda não estão bem assentados. Muito se fala sobre a possibilidade jurídica de flexibilização contratual em decorrência de caso fortuito ou força maior — o que se faz por meio da aplicação artigo 393, parágrafo único, do Código Civil —, mas, tendo em vista a inexistência de precedentes que auxiliem na busca atual por uma solução, a aplicabilidade desse conceito, até o momento, ainda tem ocorrido por meio de análise individualizada do caso concreto. Exemplo são as particularidades atinentes às companhias aéreas, que, por conta do demasiado volume de reagendamentos e cancelamentos de voos, passaram a invocar aquela previsão do artigo 734 do Código Civil. Posteriormente, contudo, publicada a Medida Provisória 925/2020, entrou em cena um pacote emergencial específico para esses casos, que prevê uma série de condições diferenciadas para devolução, pelas companhias, de valores pagos pelo consumidor por viagens que foram canceladas.

De outra sorte, incontroversa é a noção de que o princípio da força obrigatória das convenções contratuais — a pacta sunt servanda, tal qual é denominada no âmbito jurídico — observa forte mitigação desde o advento da nova codificação material privada, ganhando destaque, por outro lado, o princípio da função social dos contratos. Aqui, diante das condições ocasionadas pela pandemia do coronavírus, há a possibilidade de alterações tanto dos contratos de natureza civil quanto daqueles de natureza consumerista. Para tanto, o Código Civil exige, cumulativamente, (i) motivo imprevisível (artigo 317) ou acontecimentos imprevisíveis e extraordinários (artigo 478) e (ii) onerosidade excessiva (artigo 478). Já o Código de Defesa do Consumidor é menos rigoroso, requisitando unicamente a onerosidade excessiva (artigo 6º, inciso V). Assim, em ambos os casos, o excessivo prejuízo da parte pode ensejar a alteração do contrato, sendo possível, assim, por exemplo, o diferimento dos prazos de pagamento a fornecedores.

É preciso repisar, contudo, que as balizas para a revisão contratual no contexto da pandemia atual ainda são nebulosas, estando as relações jurídicas e o próprio Poder Judiciário em franca adaptação. Assim, o planejamento do negócio e a mitigação de danos devem se nortear pela flexibilidade, levando em conta a ocorrência, no plano fático, de possíveis mudanças nos próximos meses.

Nesse sentido, o Escritório se coloca à disposição para sanar quaisquer dúvidas.